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Métodos Adequados de Resolução de Conflitos como Ferramenta para um Ambiente de Trabalho Mais Diverso e Seguro

Ícone de um calendário 7 de março de 2025
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Métodos Adequados de Resolução de Conflitos como Ferramenta para um Ambiente de Trabalho Mais Diverso e Seguro

Escrito por Elisa Lucena¹

Introdução

Como os métodos adequados de resolução de conflitos podem auxiliar na construção e manutenção de um ambiente de trabalho mais diverso e seguro? Na proximidade de mais um oito de março, esse breve artigo se propõe a refletir sobre essa pergunta no contexto específico da prevenção de assédio e conflitos.

Conflitos internos são um grande desafio para as organizações. Eles drenam tempo, energia e dinheiro, geram estresse adicional, desviam a atenção dos principais objetivos do trabalho e minam a moral da equipe. Esses conflitos se apresentam sobre uma miríade diversa de tema e envolvem atores de diferentes graus de hierarquia.

De maneira frequente, essas situações se apresentam de maneira mais grave e podem configurar assédio.
Tanto as situações conflituosas como aquelas que podem ser caracterizadas como assédio tendem a ter como alvo colaboradores parte de uma população minorizada ou de alguma maneira mais vulnerável – como mulheres, pessoas pretas, membros da comunidade LGBTQIAP+, pessoas com deficiência, entre outros.

Resposta Tradicional

A resposta tradicional da maioria das empresas se concentra em dois caminhos principais (i) na constituição de um canal de denúncias investigativo e sancionador – que também pode ser chamado de um canal baseado em direitos ou (ii) na delegação da atividade de dirimir esses conflitos e encaminhar as situações mais graves àqueles com cargos de gerência e supervisão. Embora esses mecanismos tenham seu valor, nossa experiência mostra que eles são insuficientes para prevenir e resolver adequadamente situações de
assédio e outros conflitos.

Quanto à primeira via mencionada, de acordo com as melhores práticas internacionais, todo sistema de gerenciamento de conflitos deve ter em sua composição um canal baseado em direitos. Cabe a este canal receber as reclamações formais quanto a comportamentos incompatíveis com as normativas da empresa, realizar a investigação quanto aos mesmos e apresentar uma resposta formal ao reclamante, imputando, quando aplicável, as sanções cabíveis ao reclamado.

Devemos considerar, por outro lado, a dificuldade de empresas dos mais diversos portes preverem todo tipo de situação e comportamento em suas políticas internas e o desafio inato de apresentar evidências para algumas situações bastantes graves que podem se desenrolar no ambiente de trabalho.

A segunda via mencionada é calcada na ideia de que a resolução de conflitos é função inata ao trabalho da liderança. Muito embora, em alguns casos, seja benéfico o envolvimento de um líder na resolução da disputa, existem muitos colaboradores com funções de gestão sem a expertise adequada para lidar com determinados conflitos ou
situações sensíveis como assédio. Outro desafio que se impõe, a depender do tamanho da equipe, é a proximidade dessa liderança com os envolvidos, o que pode inibir que vítimas de um comportamento inadequado busquem auxílio por receio de consequências do relato em sua imagem ou perspectivas profissionais.

Além disso, as melhores práticas e doutrina internacionais indicam que muitos colaboradores que são assediados ou vivem conflitos graves não apresentam, e não desejam apresentar, uma queixa formal. Isso se dá por diversos motivos, como: (i) desconfiança quanto à efetividade dos canais existentes; (ii) desejo de preservar sua privacidade; (iii) receio quanto ao desgaste (pessoal e profissional) que o mecanismo pode gerar e; (iv) não existência do nível de provas exigidos pelos canais de investigação e adjudicação. Como consequência, existe uma subnotificação dos casos que tem o potencial de esconder riscos jurídicos e de imagem, além de tornar mais difícil o trabalho de gestão de pensar e implementar políticas compatíveis com o ambiente de trabalho.²

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Uma nova abordagem

Qual seria então a solução? E como os métodos adequados de resolução de conflitos poderiam auxiliar?

Mary Rowe, uma das maiores especialistas na prevenção e endereçamento de situações de assédio e conflito em ambientes de trabalho, parte da premissa de que não não existem política ou procedimento perfeitos para esse tipo de situação, mas defende
uma abordagem integrada de sistema de resolução de disputas que forneça opções de canais baseadas em interesses e baseada em direitos para todos os públicos potencialmente envolvidos direta ou indiretamente em situações de assédio.³

Isso porque, à medida que mais opções de tratamento de queixas se tornam disponíveis, mais pessoas apresentam suas preocupações e mais fácil é de se encontrar ferramentas adequadas para a resolução daquele tipo de demanda. Dessa maneira, a prevenção e o gerenciamento efetivos de conflitos e situações de assédio em organizações deve se fundar na apresentação de diversas opções de canais para o tratamento de queixas de variados tipos.⁴

Nesse contexto, os métodos adequados de resolução de conflitos apresentam-se como valiosas ferramentas que agregam a esse sistema opções de baixo custo envolvendo a negociação e a mediação de conflitos. Esses métodos mostram-se adequados para situações ainda em estágios iniciais, bem como para situações mais escaladas.

Não há um rol taxativo de canais que vá funcionar para todas as empresas. Defendemos que o ideal é que, previamente ao desenho do sistema de múltiplas opções, seja realizado um diagnóstico acerca dos problemas enfrentados e seu contexto para que o sistema possa ser customizado à realidade da organização.

Porém, no leque de canais que podem compor um sistema de prevenção e gerenciamento de conflitos e assédio, podemos, além do canal de investigação baseada em direitos e adjudicação (ex.: canal de denúncias mencionado anteriormente) citar as seguintes:

1. Abordagens preventivas baseadas em interesses, envolvendo treinamentos da equipe

2. Abordagem direta entre os envolvidos, com treinamento e aconselhamento neutro

3. Abordagens indiretas, advindas da gestão

4. Intervenção informal de uma terceira parte treinada

5. Mediação entre pares

6. Mediação clássica, para casos mais complexos

   

Abordagens Preventivas

Muito embora as abordagens preventivas não constituam um canal em si, recomendamos que faça parte da abordagem de gerenciamento de conflitos internos e prevenção de assédio uma rotina de treinamentos a respeito de temas diversos como:
comunicação, código de conduta, assédio, racismo, machismo e outros temas que se mostrem relevantes na convivência dos colaboradores. A forma e a periodicidade dos treinamentos podem variar conforme a necessidade e o perfil da companhia.

É especialmente importante entender que nem sempre os colaboradores têm consciência de que determinado comportamento é inadequado. Por isso, um sistema que busque a prevenção desse tipo de situação precisa abarcar políticas e treinamentos reiterados sobre o assunto, a opções de canais que envolvam conversas educativas como a abordagem genérica

  
Abordagem Direta

Nessa opção, a empresa fornece estrutura por meio de treinamentos e aconselhamento neutro para que o colaborador que está se sentindo de algum modo assediado ou incomodado possa conversar com a pessoa envolvida na situação. O objetivo da abordagem direta é a interrupção de qualquer assédio ou conflito que tenha ocorrido ou que esteja em curso sem a necessidade de um processo de apuração de fatos, investigação ou sanções.

  
Abordagem Genérica

Nessa opção, o colaborador que se encontra diante de um comportamento inadequado ou mesmo de uma situação que possa configurar-se como assédio tem a possibilidade de solicitar a um terceiro intermediário para que peça ao responsável pelo departamento ou ao setor de Recursos Humanos que sejam adotadas medidas genéricas educativas e/ou preventivas, visando interromper tal ação sem a necessidade de uma conversa direta com a pessoa cuja conduta está sendo fonte de desconforto ou de uma investigação. Caso a empresa adote treinamentos na abordagem preventiva, a utilização da abordagem genérica fica ainda mais orgânica à rotina.

  
Intervenção Informal

A intervenção informal fornece a possibilidade de os colaboradores acionarem um colega, treinado em técnicas de escuta, comunicação e mediação, além de conhecimento sobre o sistema, suas políticas e procedimentos, para intervir junto ao outro colega envolvido no conflito, auxiliando no diálogo para que o comportamento ofensivo seja interrompido ou, se possível, as partes alcancem um entendimento.

    
Mediação entre Pares

Nessa opção, os colaboradores contam com pares treinados em técnicas de negociação e mediação para atuarem como terceiros neutros. De uma maneira mais estruturada do que na intervenção informal, a mediação proporciona um espaço seguro e confiável para que essas conversas e negociações aconteçam com o auxílio de um neutro capacitado, garantindo total confidencialidade a seus usuários.

O mediador auxilia no desenvolvimento das negociações encorajando as partes a ventilarem suas emoções e reconhecerem a perspectiva do outro colaborador. A mediação pode também auxiliar os envolvidos a transporem suas posições iniciais ajudando-os a identificar seus interesses e a desenvolver soluções criativas para alcançá-los.

  
Mediação Clássica

A opção da mediação clássica propicia que os colaboradores contem com um terceiro neutro formalmente treinado e externo à instituição como mediador para que os auxilie a chegar a um acordo através de técnicas de negociação e mediação, de acordo com a Lei Federal nº 13.140/2015.

Essa opção é especialmente interessante para situações mais complexas que se beneficiem de um expert como mediador ou em que haja uma desconfiança da neutralidade dos mediadores-pares diante dos envolvidos ou da situação em si.

  

Conclusão

Em suma, com mais opções disponíveis, maior a probabilidade de colaboradores que estejam com problemas sérios buscarem um dos canais em uma janela de tempo adequada. Além disso, haveria alternativas adequadas para questões mais cotidianas que não demandam, necessariamente, investigações e sanções.

Para casos de assédio ou conflitos sensíveis, a existência de diferentes canais de resolução transmite a mensagem de que a empresa se preocupa genuinamente com a
prevenção e solução dessas situações. Ademais, canais baseados em interesses, como a abordagem genérica e a mediação, garantem aos colaboradores uma sensação de controle sobre a situação e oferecem um espaço seguro para expressão e escuta qualificada.

Por fim, com o aumento do uso desses canais, as organizações obtêm dados valiosos sobre conflitos internos, permitindo o desenvolvimento de estratégias preventivas e a promoção de um ambiente de trabalho mais seguro, saudável e inclusivo.

  

Referências

¹ Advogada e mediadora empresarial com atuação em casos complexos de grande repercussão nacional e internacional. Bacharel e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo (USP). Designer do Sistema Integrado para Prevenção de Assédio e Gerenciamento de Conflitos Internos (SIGEC) da CPTM. Sócia da Faleck & Associados.

² SARAIVA, Dayane; FALECK, Diego; LUCENA; Elisa. Sistema Integrado de Gerenciamento de Conflitos Internos e Prevenção de Assédio: Uma Nova Abordagem in Prevenção de Diputas. São Paulo: Quartier Latin, 2024.

³ ROWE, M. Dealing with harassment: a systems approach. In: STOCKDALE, M. S. (Ed.). Women and Work: A Research and Policy Series, vol. 5: Sexual harassment in the workplace: Perspectives,
frontiers, and response strategies. Thousand Oaks, CA: SAGE Publications, 1996, p. 246.

⁴ GADLIN, H. Bargaining in the Shadow of Management: Integrated Conflict Management Systems. In: MOFFIT, Michael L.; BORDONE, Robert C. The Handbook of Dispute Resolution. San Francisco: Jossey-Bass Press, 2005.

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